A contratempo

Confundiam-na as palavras que lhe ouvia. Em tempos esperara dele que também se apaixonasse. Por ela.
Da mesma forma estranha e insidiosa que se instalara nela a paixão que sentia por ele.

Soprou o café que queria beber para engolir melhor o que lhe ficava atravessado na garganta agora seca. Precisava de dar espaço ao espanto que lhe subia do peito. De o soltar.
Bebeu-o devagarinho sem levantar a cabeça. Ainda não o queria olhar. Não sem ainda perceber o que ele queria dizer.
Olhava agora as borras de café no fundo da chávena. Raras, uniformemente espalhadas com uma mancha de maior densidade a um canto. Lembrou-se das leituras que costumavam fazer quando estava entre amigas. Das gargalhadas ao ouvir os prognósticos. Que quereria dizer aquela mancha mais forte, ali ao cantinho?

Ouves-me?
Voltou e olhou para ele. Sim ouvia-o. O problema era não o entender.
Não entender também como um homem assim lhe entrara coração dentro.
Não o disse. Calou as palavras que lhe acudiam á boca. Empurrou-as para bem dentro de si. Para o sítio onde todas as coisas acabam por desaparecer. Quando é preciso.

E pronto. É isto. Acabei sem saber como por me apaixonar por ti. És-me necessária. Sinto-o cada vez mais.
Foi então, enquanto lhe ouvia estas palavras que se despediu do que sentia. Um enorme vazio assaltou-a. Pediu outro café.

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