Aranhando

Cola-se ás coisas por linhas finíssimas, invisíveis de tão transparentes e inodoras, como se de aranha se tratasse e uma teia criasse.
Num sítio qualquer e ao que encontra, seja o que for.
Lança só. Cola-se só. Para não se deixar cair.
Ainda não.

O rendilhado que tece não é perfeito, como ela não é também. Mas não desiste ainda.
Um dia de tão frágil tecer desistirá. Sabe-o desde sempre.
Antes ainda da rotura da teia desarmónica que cria.

Não quer ser abandonada. Prefere abandonar.
Prefere deixar que ser deixada. Doer-lhe-á menos. Sabe disso.
Esconde de quem lhe apara a teia, os medos, as sombras, os pesadelos que a atormentam, com máscaras que lhe enfeitam com sorrisos uma face que já desconhece há muito.
Nos espelhos que lhe enfeitam os espaços por onde se move só aproveita a luz e os reflexos que ama.
Não se confronta. Não se reflecte. Não se reconheceria.
E teria medo do que veria.
Mas estão lá. Sempre. Porque um dia o fará.
Para se despedir e saber de quem se despede e do quê.
Talvez então seja sugada a outra dimensão para lá do espelho, qual Alice do País das Maravilhas, e seja aquela que ninguém sonhou, neste mundo que nunca foi o seu.
Então não será mau desistir despedindo-se assim, quando tiver coragem!

Até lá, vê-la-ão tranquila, porque ela o sabe ser, qual aranha laboriosa embora imperfeita, tecendo sem parar.
A máscara?
Está sempre lá. Ninguém lha queira tirar. Já é parte dela.
Deixem-na sorrir, mesmo que chore por dentro.
Essa será a mistura perfeita para a cola na sua construção.

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