O livro vermelho

Espantava-se quando via o sorriso abrir-se depois de desfolharem sem sentido e lógica alguma aquele livro pesadão, cheio de letras que não contava histórias e onde não viviam figuras.
Nos livros em que desfolhava uma a uma as páginas, o sorriso, o medo, o espanto e até a lágrima tinham letras gordas que juntas contavam aventuras e mostravam as personagens, ora tristes, ora alegres.
Tudo fazia sentido e sabia bem ouvir ou ler.
Era uma viagem que se fazia do princípio ao fim com ligeiros intervalos para algumas perguntas ou para resolver alguns receios.
Não podia entender como os grandes procuravam aquele livro tamanho e procuravam com sofreguidão determinada página e se saciavam com pouca coisa, largando-o depois. Como se contivesse uma qualquer poção mágica.
Só um dia, quando no meio duma história foi visitado por uma palavra estranha, lhe entendeu o valor.
"Saiu da toca aturdido...", rezava a frase e quis saber melhor.
Levou-a a mãe ao livro que encerrava o mistério. Desfolharam como tinha visto fazer e encontraram a palavra: Aturdido ou seja aturdimento, o que equivalia a perturbação dos sentidos ou atordoar. E o jogo continuava.
Atordoar seria fazer perder os sentidos, entontecer.
E podia continuar.
E foi assim que aprendeu a jogar no livro grande e vermelho de folhas amareladas. E a sorrir também.
Nunca mais deixou um livro por ler por não o entender. Por não perceber para que servia. Se via sorrisos. Queria sorrir também.

Sem comentários:

Enviar um comentário