O Músico

" Tenho saudades das memórias, que o futuro me há-de trazer"
Calou-se e olhou em frente, como se o estivesse a pressentir.
Olhei-lhe a idade.
Perguntei-me, como ter saudades? Ou memórias do que está para vir?
Porque nada há para trás, que valha a pena?
Respondi-me, porque se sonha!

Era músico. Na sua alma, nasciam pautas onde bailavam colcheias e mínimas.
Uma sinfonia a crescer. Que, um dia, seria tocada.

O que fazemos tem devir. E retorno também.

Sonhava os aplausos e praticava a vénia que faria, de batuta na mão.
Por isso, tinha saudades e memórias do que está para vir.
Nos sonhos, que lhe davam força, para correr, com partituras debaixo do braço, dum lado para o outro. Aturar alunos sem garra. Cumprir prazos de entrega. Entreter tertúlias, onde se falava dos tempos que temos para viver.
E tantas coisas para fazer!
Haviam as sonoridades da sua terra, as vozes que nunca se mostraram. Haviam, mil melodias de todas as cores, a nascerem em murmúrios e a fazerem-se obra em faixas de cd's.
E, as vozes, que eram para domar e as orquestras, para as abraçar, pertencem-lhe todas e a todas anseia.

Terão os sonhos devir?
E retorno? Também?
Têm de ter. Tem de ser assim.

Os olhos fitos no infinito, voltam a nós, a mim. Um sorriso ilumina-lhe o rosto. Sorrio com ele. Acreditamos os dois.
Mas, sossego a saudade. Porque este momento é muito mais importante. O de a declarar.
E voar para lá dela, num futuro que há-de vir. Virá!

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